Como professores de literatura e linguagem temos de lidar com o aspecto motivacional dos alunos no tocante à leitura, e isso é, no meu ponto de vista, o fator mais desafiador das aulas. Vivemos inseridos em um mundo no qual o bombardeio de imagens e estímulos das redes sociais roubam o precioso tempo e a atenção de nossos alunos e com efeito, sobra pouco espaço para a leitura.
Uma ideia para estimular os alunos à leitura é criar um projeto que não se resume à leitura da obra e a feitura de uma prova ao término da mesma. Não há nada menos estimulante do que dizermos aos alunos que eles devem ler determinado livro, pois essa matéria irá cair na prova. Broxante ao extremo!!!
Logo, foi pensando em todos esses aspectos que procurei juntamente com a professora de português fazer um trabalho interdisciplinar entre as disciplinas de língua inglesa e de língua portuguesa com os alunos do ensino fundamental II. A partir da leitura da obra “A Terra dos Meninos Pelados” de Graciliano Ramos, os alunos montaram um projeto que contemplou não apenas a leitura da obra, mas um processo por meio de um percurso pedagógico que envolveu leitura, debate e produção de texto.
Segue abaixo um esquema desse percurso:
Os alunos do 6º e 7º anos leram a obra e produziram um resumo do livro em inglês. Eles também escreveram um diário e fizeram um cartaz da terra dos meninos pelados (Tatipirun), como se eles próprios a tivessem visitado. Segue abaixo alguns trechos de ambas as produções.
The book tells the story of Raimundo, a young boy who had no hair, and had each eye in different color. Due to that he was always provoked by his friends. One day he crossed the yard and walked and walked along. Suddenly he came across an orange tree they talked to each other and he got an orange. He walked a little further and came across a rock they talked to each other and he walked away again… Further on he found a chest, he met her with a spider that gave him clothes from there. He made a lot of friends and promissed to come back with more friends…
(17/09/21) Meu querido diário, hoje foi um dia terrível!!! Eu entrei na sala de aula e todos já começaram a rir. Eu odeio essas pessoas, por que será que elas zoam tanto comigo? Parece até que eu sou um inimigo. Hoje contei pra minha professora sobre Tatipirun, ela disse que eu sou louco e disse que se eu ficar imaginando coisas vou acabar com a minha vida. Tenho tanta saudade de Tatipirun, todos são legais lá, e todos são iguais a mim.
E se Tatipirun existisse? Como ela seria?
Aos alunos do 8º e 9º anos coube escrever poesias e um pequeno ensaio em inglês sobre os aspectos positivos e negativos da obra. Por fim, os alunos escreveram uma crítica de cinema em inglês sobre a suposta adaptação ao cinema da obra literária. Seguem um exemplo abaixo.
A bela Tatipirun
Havia uma terra
Onde todos eram iguais
Chegava passando por uma serra,
Tatipirun era demais.
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Nessa terra os meninos eram sensacionais.
Todos tinham olhos azuis e pretos,
Eram pessoas ruins? Jamais!
Todos tinham seus jeitos.
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Uma terra sem preconceitos
De objetos, animais e plantas.
Todos tinham os seus direitos.
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As pessoas eram rabugentas,
Eram todos calvos
E todas as crianças vivem juntas!
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The Land of Naked Boys counterpoint.
The Land of Naked Boys, the Land of Raimundo and his imaginative image of a world with friends, where everyone was equal. Drawn on the floor of his sidewalk, crossing the walls of his house and arriving in this country, Tatipirum. Graciliano Ramos’ book shows us the prejudice that many people suffer because of their differences. Upon entering a new world, in which he was included, the author shows us that we are all similar and that we should be treated with equality and dignity, accepting each other’s differences. In addition, the language is easy to understand and can be understood by beginning readers. Graciliano Ramos wrote a book called The Land of Naked Boys, a book about bullying and also about the suffering of a child for being different. The child called Raimundo was mocked for being bald and having an eye of every color. The author of the book focused on the part where the child imagines being enough for everyone, happy and joyful, even if only in their imagination. However, the work presents the thoughts of a child who chooses his responsibilities first, even imagining something better. The author shows us a responsible child, who first decides to do his task, and then have fun. The book is an educational reading and makes us reflect on the children’s thoughts, in addition to the difficulties they need to deal.
The Naked Boys’s Land – Film Review
The Naked Boy’s Land is a fantasy film directed by Steven Spielberg. The film is an adaptation of a book with the same name, that was written by Graciliano Ramos and released in 1939.
Raimundo, the main character, is starred by Millie Bobby Brown. He’s a lonely boy who ends up in a completely different and perfect place. He feels so happy to be in this new world since, in his city, he was bullied because of his facial features.
The cast of the film was composed of children with cancer, having the intention of giving them a little more fun. It was actually a “support” for them, where all the money received went to the construction of a charitable institution.
The film won many awards mainly because of its very special purpose and the awesome screenplay and soundtrack. Millie Bobby Brown made a great work as part of the cast, consequently winning an Oscar.
We recommend this movie for everyone, from everywhere, but especially for kids, so they can learn that judging people by their features is wrong and we should treat everybody equally.
Conclusão do projeto
Ao término de todo o projeto literário, criamos um blog juntamente com as crianças e estimulamos a produção textual dos alunos. Caso alguém se interesse por visitar o blog, segue o seu endereço: https://viagemescolargasparzinho.wordpress.com/blog/
Por fim, o trabalho com a literatura deve ir além da leitura da obra, esse mesmo trabalho deve proporcionar aos alunos um olhar rico e diferenciado da literatura.
Aos aficionados, como eu, pelo conceito aristotélico da potencialidade humana como possibilidade intrínseca de realização de obras incomensuráveis, esse pequeno texto deverá servir como reflexão sobre o belo e o grotesco na arte e na vida.
Com a simples reflexão acerca das obras criadas pelo ser humano em todos os âmbitos, podemos considerar que para criá-las faz-se necessário desenvolver uma mente criativa e impulsionada para criação. Ora, o ambiente externo de certo modo propicia ao indivíduo o impulso que mais tarde se tornará parte de sua verve criativa.
Neste sentido, é preciso salientar que também o ambiente interno será fundamental para favorecer o artista na sua criação, afinal, é a sua identidade individual que dá vida à sua obra. A sua individualidade é a marca única que dará o tom de sua arte, e com isso devemos dizer que o artista não é um super homem dotado de habilidades mágicas, mas tem de certo modo, uma paixão diferenciada pelo seu campo de atuação, tal como qualquer outro profissional.
No entanto, é possível criar obras belas se se está cercado de feiura e desalinho estético? Ora, andemos pela periferia da cidade e observemos as malfadadas construções sem nenhum planejamento urbano, estas mesmas fruto da desigualdade social e cultural de nosso país. No entanto, basta nos atentar e veremos cá ou acolá um jardim belo e planejado, um muro lindamente grafitado ou uma casa bem planejada, ainda que humilde.
O mesmo se dá em todas as artes liberais. Vejamos como exemplo a música moderna, que, com arranjos cacofônicos que exaltam o ritmo acima da melodia e letras que servem como uma espécie de hipnose coletiva para a reprodução de apenas um refrão que, não raro induz ao mal gosto e à sensualidade. Ao passo que ainda é possível ouvir uma letra instigante em batidas de hip hop ou até mesmo a bela melancolia bucólica de uma canção sertaneja cuja letra contém um que de filosofia e beleza, como vemos em Luar do Sertão de Catulo da Paixão Cearense.
O discurso que defende a situação sócio econômica como causa do declínio da manifestação cultural tal como ela é, ignora o fato que não é o dinheiro ou a fama que propicia a criação, mas a vontade e percepção do artista. Haja vista a situação social de nosso maior escritor, o bruxo do Cosme Velho, para quem a arte era trabalho, não inspiração deificada, nem tampouco o acômodo social.
Ora, como nos ensina o professor Carlos Nougué em sua belíssima obra “Das artes do Belo”, a finalidade das artes do Belo não é senão, fazer o homem propender ao bom e verdadeiro e mediante ao horrendo, visa a fazê-lo afastar-se do mal e do falso.
Tendo em vista a última premissa, sobre a qual a arte pode ser uma ponte para a verdade, se preenchemos a nossa alma com o horrendo atualmente construído sobre os pilares da beleza e do Belo destronado do bom e verdadeiro, passamos a viver em desalinho com aquele conceito da potencialidade supracitado, de modo que, ao invés de fazer crescer a nossa capacidade crítica de produzir e consumir a beleza tornamo-nos meros consumidores de péssima arte, algumas das quais nem sequer mereceriam ser cunhadas como tal.
“A finalidade das artes do Belo não é senão, fazer o homem propender ao bom e verdadeiro e mediante ao horrendo, visa a fazê-lo afastar-se do mal e do falso”.
Carlos Nougué
Concluo afirmando que nem todas as obras de arte do passado são boas, bem como nem todas as do presente são de má qualidade. Lembremos que generalizar é sempre passível de erros, contudo, atentemo-nos ao fato de que as grandes civilizações em seu auge tiveram na arte o reflexo de sua grandeza.
Nossa história começa a ser narrada por nossos pais antes mesmo de nascermos. A herança de toda a humanidade antes de nós está aqui a nosso alcance e o mais importante de tudo é saber que você é único e especial. Espero que aproveite esse poema que é um presentinho para você.